O MAGNO PROBLEMA

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.






A literatura de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentos artigos sobre história, ciências, humor, crônicas locais, crítica, política e religião, que publicou como cronista do Jornal “O Cachoeirense”. Ao professor e jornalista José Maurício do Prado, o nosso agradecimento pelo acesso aos originais.



Jornal “O Cachoeirense” Ano II, Ed.nº.73, 08 a 15 de outubro de 1978.

O MAGNO PROBLEMA
NELSON LORENA

Os jornais nos trazem a noticia de que o “Time”, órgão de publicidade dos Estados Unidos, declarou em comentário sob as condições de nosso povo, que no Brasil existem trinta milhões de crianças abandonadas. Talvez não chegue a tanto; mas que existe milhões, isso ninguém o poderá contestar. Que olhem para baixo os que estão por cima e o fato será constatado. O menor abandonado ou desamparado é uma vitima do descaso que os poderes públicos lhe devotam. É na carência em que vive, na má nutrição que está sujeito, atirado na sarjeta do abandono, revoltado contra tudo e contra todos que a delinqüência se forma, que o crime se manifesta. Crime, do qual, os poderes públicos e a sociedade são coniventes mas, irresponsabilizados. O criminoso assim gerado, torna-se artigo ou fonte de renda para os órgãos de repressão, para a justiça, para o acusador e para o acusado, como fonte de renda é o porco criado e nutrido levado ao mercado. Mas será mesmo criminoso aquele que foi uma criança abandonada, que jamais cruzou os portais de uma escola, sem instrução, sem casa para morar, sem roupa para vestir, sem um pão para atenuar a fome, sem uma esteira para dormir. Esquecido na sordidez das malocas, entre delinqüentes e viciados ali também nascidos, aprende matar e roubar. As lições que a vida lhe poderia dar, ele as aprendeu na vida desregrada que a indiferença da sociedade lhe legou. Torna-se mais vitima que réu. E a justiça dos homens, dos mesmos homens que tiveram ampla cultura, educação esmerada, carinho paterno, que aprenderam amar o próximo e a perdoar, que nunca sentiram a amargura da miséria e da fome, condena o infeliz que jamais sentiu na face o calor de um beijo materno. No banco dos réus, uma Justiça Maior, por certo colocaria aquele que não sabe levar o seu amor ao menor abandonado das favelas. O fato existe e, nem ao contrário se diga, deixou de ser intimo, intra-muros, para se projetar alem de nossas fronteiras ao ponto de ser sugerida a adoção dos carentes ou abandonados por famílias estrangeiras. Uma alta autoridade do pais, classificou de humilhante, para nos, tal oferecimento. De fato o é. No entanto, mais humilhante para nossa máquina administrativa, conhecedora de longos anos do grave problema, que aumenta e desespera, é a incapacidade de solucioná-lo. Múltiplas, nocivas e imprevisíveis são as conseqüências da perpetuidade desse estado de coisas. É habito nosso, criticar aquilo que nos parece errado, bradamos que “o carro está atolado” e não fazemos nenhum esforço para desatolá-lo. Quem sabe se, cada cidade por intermédio de sua administração, conseguisse que cada família, as mais abastadas, ou os casais sem filhos, após uma campanha bem orientada adotassem uma dessas crianças? Talvez fosse uma solução. O desamparado não mais o seria. Deixaria de ser um miserável, um criminoso em potencial. Teria um lar, afeição, educação, instrução, cama, comida, roupas para vestir, participaria como homem da vida social e, não mais, a sombra da delinqüência o acompanharia.

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