POLÍTICA E POLITICAGEM

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VI, edição nº.293, de 14 a 20 de março de 1983.




POLÍTICA E POLITICAGEM

NELSON LORENA



O assunto ao qual me prendo é, por estranho que pareça, um dos mais detestáveis para meu modo de sentir mas, nem por isso deixa de ser o meu tema: Política – Arte de governar, alcançar o Poder. Para que a ele possamos chegar, todos os meios, todos os recursos, por mais contraditórios que sejam, por mais reprováveis que nos pareçam, são válidos. O escrúpulo desaparece onde a vaidade domina as ambições. Abdicam os homens dos mais nobres sentimentos de dignidade, de honra, do caráter enfim, quando os degraus do Poder exigem deles a mentira e as vãs promessas para a consolidação da posição almejada. Filosoficamente, é a Política “a mais bela das artes”, segundo Platão. Dela emana tudo que diz respeito à sobrevivência humana: saúde, instrução, habitação, alimentação, os cuidados com a terra, donde brotam as coisas necessárias à nossa vida. A política, como todas as demais artes, é fruto das conquistas que nossos espíritos, através das vidas sucessivas, em sua eternidade amealham. Ninguém se torna, de uma hora para outra, poeta, músico, escultor, romancista, simplesmente porque o queira; o político já nasce feito. É possuidor do “dom” conseguido no Tempo. Daí a dificuldade, não de achar o Poder para o homem, mas sim o Homem para o Poder. A arte política está corrompida, tornou-se a mais fácil das profissões; para exercê-la não se exige currículos, cultura, idoneidade moral, alfabetização, pois, tudo é valido quando se quer alcançar a popularidade, viver-se nababescamente, sem se aperceber dos miseráveis que vivem comendo lixo para sobreviver. A falta do homem politicamente estruturado, do homem certo para o lugar certo nos aponta, sem que saiamos de nossas fronteiras, os fracassos da Transamazônica, da Ferrovia do Aço, das Usinas Nucleares, da solução da Seca no Nordeste, da Paulipetro, e outras. Uma inflação a setenta por cento nos expunha ao descrédito... Fizemos uma revolução e a elevamos a cento e vinte, numa demonstração tácita de incapacidade administrativa. O mal que nos aflige politicamente é a ausência do senso de autocrítica. Todos se julgam capazes de soluções, para as quais não possuem a necessária capacidade. Aí está o problema da seca do nordeste e suas vergonhosas conseqüências. D.Pedro II venderia, se preciso fosse, a última pedra da coroa para evitar o espetáculo degradante na vida de nossos irmãos do Norte. Juscelino e o presidente Médici foram aconselhados a não visitar os flagelados em seu martírio de fome e desolação tal o dantesco das cenas, onde o gado e todos os animais morrem à porta do dono insepulto! É sabido que o subsolo daquela região possui uma reserva de água equivalente a quinze baías da Guanabara e a seis vezes Itaipu. Procura-se petróleo onde não tem e abandona-se a água e a vida do nordestino, onde elas se encontram. Verbas têm sido conseguidas, mas a solução se eterniza! Parece-nos haver interesses inconfessáveis, pois, solucionando-se o problema com o aproveitamento da água do subsolo, as verbas não mais serão concedidas e seus desvios deixariam de beneficiar os interessados na sua perpetuação. Nossa Política deixou seu objetivo, seu fim, tornou-se um meio.


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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