LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
A literatura de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentos artigos sobre história, ciências, humor, crônicas locais, crítica, política e religião, que publicou como cronista do Jornal “O Cachoeirense”. Ao professor e jornalista José Maurício do Prado, o nosso agradecimento pelo acesso aos originais.
Jornal “O Cachoeirense” Ano II, Ed.Nº. 66, 21 a 27 de agosto de 1978.
PAULO VI E A VACILANTE IGREJA
A Barca de São Pedro
A Barca de São Pedro
NELSON LORENA
Quando alimentamos um ideal, que faz parte de nossa vida, que nele vivemos, nele respiramos e quando esse ideal apresenta sinais de decomposição pela alheia incompreensão e conceitos antagônicos, enchemo-nos de desencanto e desilusões. Nossa vida, através da meditação e de seus longos anos, ensinou-nos que há um critério justo em todo julgamento, que nos conduz à conformação das coisas que, a princípio, pareciam nos ferir. Aprendemos com ela, que a razão dessas mesmas coisas, também poderia estar com aqueles cujos conceitos nos contrariavam, considerando que não somos infalíveis e, ainda mais, que o “mal é muitas vezes o bem, mal compreendido”. Escrevemos estas considerações a propósito do pontificado de Paulo VI, que tanta dor de cabeça vem dando aos conservadores, aos tradicionalistas. Ora, todos sabemos, que já Pio XII, em seus últimos anos de pontificado, declarava que: ”A Igreja está ameaçada, não somente de fora mas, também pelas forças interiores da debilidade e do declínio”. Censurou o Sumo Pontífice àqueles “cuja fé é oculta nos desvãos de sua vida privada, ao passo que a imoralidade, a malícia, a avareza e toda espécie de maldade é usada abundantemente nas salas de visitas e nos lugares públicos”. Queixam-se que a bibliografia católica italiana é paupérrima; que os pais, limitam-se a batizar os filhos, desinteressando-se pela sua educação religiosa. Paulo VI, adverte que há um misterioso processo de autodemolição da Igreja; alerta contra a debilidade da Fé; procura o diálogo, através do ecumenismo; trabalha pela renovação da Igreja, mantendo sempre a imutabilidade de sua Fé; leva Roma a Jerusalém, pela primeira vez em toda a sua história eclesiástica. O Conclave realizado em Junho de 1963, sob “a inspiração do Espírito Santo” escolhe, em nome de Deus, o Cardeal Montini para dirigir a “Barca de São Pedro”. Paulo VI enfeixa nas mãos o poder “Daquele que dá ou tira quando Lhe apraz”. Os tradicionalistas que o combatem, não estarão se insurgindo contra uma determinação divina? Defendem a infalibilidade papal, consagrada em 1870, somente quando lhes convém? Modifica-se com o tempo, a tradição, a moral, os costumes e o progresso; de outra forma, estaríamos iluminando nossas casas com lampiões e nos locomovendo em carros de bois. Agora, considerarem o pontificado de Paulo VI como o mais desastroso e atormentado de toda a história da Igreja é intransigência de um tradicionalismo que se desfaz ante a concepção moderna de um mundo que, evidentemente, se renova em seu aspecto religioso. Não está longe o tempo em que o presente retornará ao passado e a renovação decantada por Paulo VI fará retroceder o cristianismo ao contubérnio simples, fraterno, humilde e puro dos primeiros cristãos.Tudo é flexível quando Deus comanda. E, quando Ele “lança mão de alguém para seus desígnios, nada mais pode contê-Lo”. “Eu sou o Senhor”, diz Ele pela boca do profeta Jeremias; “fui EU em quem fez a terra, os homens e os animais e os entrego a quem Me apraz”. Conformem-se, pois, os descontentes ante a vacilante situação da Igreja. Somos peças esparsas de um complicadíssimo mecanismo, atiradas aqui, ali e acolá, aparentemente destituídas de valor, mas que Deus que tudo provê, tudo sabe, está, a despeito da rebeldia dos homens, ajustando cada uma em seu devido lugar, para que, um dia, a humanidade marche na harmonia do seu conjunto. Embora, acatólicos, no sentido vulgar do termo, admiramos a figura de Paulo VI. Nobre foi sua intenção de unir indistintamente os homens, dando a cada um deles um lugar na “barca de São Pedro”.
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