A ETERNIDADE DA VIDA

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.





O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1978 e 1990 sobre história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. O destaque de hoje é para a matéria publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano III, edição nº.111, de 09 a 15 de julho de 1979.



A ETERNIDADE DA VIDA
NELSON LORENA


Quando Jesus dissera: “Deixai os mortos enterrarem os seus mortos.”, muitos dos seus seguidores estranharam suas palavras por encerrarem uma moral contrária à piedade e à dedicação que os mortos merecem. Mas, se considerarmos que nossas almas, nossos espíritos foram criados antes dos corpos, nossa razão nos conduz ao raciocínio de que, sendo a causa superior ao efeito, a verdadeira vida é a espiritual, verdadeira e eterna; não passa pelo fenômeno da morte o que é o que acontece com o corpo somático, transitório e putrescível. Nosso corpo é a roupagem da qual o espírito se reveste, como elemento probatório e necessário ao progresso material do mundo em que vivemos. Os que não admitem a continuidade da vida além do corpo, são os “Mortos”, a quem Jesus se dirigia. Os que nos precederam, vivem, nos governam, como dizia A.Comte, nos orientam e nos protegem, são os vivos. Fomos certa madrugada de 1944, acordados com o aviso de meu sogro, já falecido, advertindo-nos que um incêndio se iniciava na varanda dos fundos da casa. Ante o aviso feito de maneira categórica, levantamo-nos, constatamos a veracidade do fato, tomamos as providências que o caso exigia e o desastre foi contornado. “Os que se foram, não estão mais onde estavam, mas estão sempre onde estamos”, vivos, sempre vivos. A propósito, pretendemos robustecer a convicção que possuímos, quando a isso fazemos jus, da assistência que os chamados “mortos” prestam aos “vivos”, levando ao conhecimento dos leitores o fato seguinte: Em 1860,o inverno foi demasiado intenso nos EUA. A capital Washington, estava coberta de neve. O Dr. Weir Mitchell, estava sentado em frente à lareira de sua mansão, se aquecendo após uma noite de grande trabalho, quando alguém lhe bate à porta. Aberta esta, surge-lhe à frente a figura de uma menina, mal vestida, com um xale vermelho protegendo cabeça, botas rotas, coberta de neve, que lhe diz: “Doutor, minha mãe está muito doente e mandou lhe chamar”. “Não posso minha filha”, responde-lhe o Dr.,“são quase três horas, ademais estou muito cansado, procure o médico de sua família”. Fazendo, em seguida, menção de fechar a porta, mas a menina gritou:”Se o Sr. não for, mamãe morrerá, ela me disse que nenhum outro médico poderá salva-la!” O Dr. cedeu, a menina tremia de frio, com a cabeça protegida pelo xale nevado. Vestindo um pesado capote, o Dr. tomou-a pela mão, e ambos saíram. Chegaram por fim a uma choupana modesta. A menina anunciou: ”Mamãe ele está aqui; é o Dr. Weir Mitchell que você falou”. O médico compreendeu, após breve exame, o estado grave da enferma e sentou-se para receitar, dizendo à doente: “A senhora tem uma filha corajosa, mas será preciso que ela volte comigo, o que quer dizer que terá de enfrentar a neve novamente; e ela me parece tão frágil!” “O senhor disse que foi minha filha que o trouxe aqui?” “Mas, claro, replicou o médico”. “A senhora mesma a viu quando eu cheguei em seu quarto.” “Não, meu senhor; eu não poderia vê-la!” “Como assim? A senhora não é cega!” Então, nesse momento, a senhora recostou-se no travesseiro e fixou os olhos no médico, dizendo, “Essa menina que o Sr. fala, como era ela? Como estava vestida?” “Ela era magra, pequena, olhos grandes e tristes, trazia um xale vermelho e usava botas rotas, grandes demais para seus pés. Está vendo como foi sua filha que me trouxe até aqui?” “Não estou compreendendo, disse a doente com certa dificuldade.” E, apontando para um guarda roupas, pediu-lhe: “Quer ir até aquele guarda-roupas, doutor?” “O Sr. encontrará algumas roupas no chão e, embaixo, um par de botas que eu usava.” O médico abriu a porta do móvel, olhou para o interior, e disse gravemente: “Era exatamente esta a roupa que ela usava.” “Não pode ser, minha filha morreu há duas semanas.” O médico olhando mais atenciosamente para dentro do guarda-roupas, notou que a roupa que ela usara, ainda estava com sinais de neve. A menina que, até a pouco, estava a seu lado, havia desaparecido. Ela era visível e audível somente para ele e somente ele podia tocá-la e senti-la como se viva fosse! Os céticos, aos quais o fato chegou ao seu conhecimento, perguntavam: “Não seria uma alucinação do Dr.Mitchell?” “Não teria sido um sonho?” O Dr.Mitchell, entretanto, insistia em que a menina fora procurá-lo e que o levara para junto da mulher, realmente enferma. Acreditava que a menina teria sido uma aparição, suficientemente real, ao ponto de ele sair de casa numa tarde de intensa invernia para visitar uma enferma. Aos céticos ele costumava perguntar: ”Se não tivesse sido levado para lá por alguém vivo ou por um espírito, acha que sairia de casa?” “E, já como saí, como sem dúvida nenhuma saí, quem me guiou até ao quarto de uma mulher agonizante?”


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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