LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
Com sua fertilidade característica, Nelson Lorena escreveu em forma de crônicas sobre, história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. Do acervo de sua produção, entre 1977 e 1990, destacamos a matéria publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano I, edição nº.49, de 24 a 29 de abril de 1978.
O FATALISMO DA EVOLUÇÃO
NELSON LORENA
Tenho minhas dúvidas, quanto à influência decisiva da Moral religiosa na conduta da humanidade. Acho mesmo que o aperfeiçoamento da alma humana far-se-á em etapas, pelo seu próprio esforço. Assemelha-se aquela, à luz que ilumina os vários e tortuosos caminhos de uma mina, onde a tenacidade, o suarento esforço do ambicioso mineiro, descobre o ouro. De nada valeria essa luz, se não existisse o imperativo do progresso humano que, nascido nos céus, tem sua continuação na Terra. Possuímos o conhecimento dessa luz, mas, conscientemente preferimos caminhar pelas tenebrosas vielas do pecado, sem que possamos opor barreiras aos imperativos de nossa contingência de seres imperfeitos. Com o archote dessa luz nas mãos, quantos arautos do Evangelho iluminaram as veredas do roubo, do contrabando e outros crimes, que a história e a imprensa hodierna põem ao nosso conhecimento. São Paulo, apóstolo, dizia; "O bem que quero não faço, mas o mal que não quero, isso faço.” e isso, porque a luz da moral religiosa, ainda nos vem de fora para dentro, sem que penetre a impermeável condição da carne que somos. Virá, algum dia, de dentro para fora: teremos luz própria e não mais caminharemos nas trevas, pois, nossa luz irá na frente. Mas, por enquanto, veremos as ovelhas do pastor, revoltadas e desobedientes. A moral religiosa condena o divórcio, condena o aborto provocado e a esterilidade desnecessária. Admito que a aceitação dessa moral esteja subordinada à compreensão, dentre os vários estados gradativos da alma humana em sua ascensão para a perfeição. Aceito este enunciado, estará justificada a desobediência de um povo que aprova resoluções contrárias às vozes que ecoam das janelas do Vaticano, sancionando coisas que a religião condena. Em várias e sutis nuances, a alma humana evolui alheia a princípios dogmáticos. Estes são a resultante daquela evolução. Até mesmo no ato de darmos esmolas, que são lampejos da fraternidade de que a paz na Terra precisa, essas nuances se manifestam. Maimnides, filósofo israelita que viveu no século XII, classifica essa piedade cristã em oito graus. O primeiro, o mais baixo, consiste em dar a esmola de má vontade; o coração não participa. O segundo, é a que se dá com prazer, mas, não proporcional às necessidades do que sofre. O terceiro quando se dá de boa vontade e proporcional às necessidades, quando se é solicitado. O quarto, quando se dá proporcionalmente ás necessidades do que sofre, entregando-lhe porém, nas mãos, provocando assim dolorosa emoção de vergonha. O quinto, o humilde recebe a esmola, conhece o seu benfeitor mas este não o conhece. O sexto, é daquele que conhece quem recebe a esmola, mas o beneficiado não conhece o doador, que se conserva no anonimato. O sétimo grau, ainda mais meritório, consiste em socorrer, sem que o benfeitor seja conhecido do necessitado e nem este o conheça, como na existência do Templo. Nesse lugar de devoção existia a “Câmara do Silêncio”, no interior da qual, as almas caridosas depositavam suas esmolas, indo os pobres recolhê-las em igual segredo. Finalmente, o oitavo, o mais meritório de todos consiste em antecipar a caridade, evitando a pobreza, seja ajudando o semelhante com boa concessão ou apreciável quantia, ou ensinando-lhe ofício, de maneira que possa ganhar a vida honestamente. Evitando-lhe a terrível necessidade de estender a mão à caridade publica. Este o mais alto grau da escada de ouro da Caridade. Lentos, mas inexoravelmente, escalaremos os degraus dessa escada com o esforço de nossas própria pernas, sob a luz da promessa Daquele que disse: “Sede perfeitos, como perfeito é vosso Pai”. Há uma sabedoria antiga que diz; morri como mineral e me demudei em planta. Morri como planta e ressurgi como animal. Morri como animal e me tornei homem. Que tenho, logo, para temer, quando a morte nunca pode diminuir-me? Na próxima vez, morrerei como homem, para haver dos anjos, as asas. A perfeição da humanidade far-se-á sob a força do incoercível, da evolução, independentemente de qualquer princípio religioso.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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