A GRANDE ESPERANÇA

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. No destaque de hoje, a matéria publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano III, edição nº.127, de 23 de outubro a 04 de novembro de 1979.




A GRANDE ESPERANÇA

NELSON LORENA

Os exemplos que a vida nos aponta trazem aos homens de boa vontade, muitíssimas vezes, angústias, desesperos, desilusões. Aos raros momentos de fraternidade e de, alguma forma, amor, sobrepõe-se a avalanche de maldade de que está a humanidade possuída. Não existe o auxílio mútuo, a reciprocidade de atenções e amizades que caracterizam o espírito religioso de que, dizem possuir nosso povo. Em todas as agremiações predominam as divergências, os atritos, as incompreensões e a intolerância, gerando o afastamento dos bem intencionados. Somente sentimos e chegamos quase a amar a Deus na hora extrema da dor, em que o abismo do sofrimento se abre à nossa frente, à força dos erros cometidos. Essa a situação do mundo em que vivemos e nos movemos, a claridade e a beleza com que Deus o dotou é ensombrada com a maldade, que já se tornou parte integrante da civilização moderna. Há, contudo uma grande esperança para todos nós. Um mundo que não vemos, mas que pressentimos, que pela Razão e Justiça nos acena a cada dia que passa; que nos fornece provas que se acumulam e se tornam habituais e demonstra que, em verdade, a vida humana se completa em Dois Mundos. E tal qual pássaro cativo, tem em um, sua liberdade limitada; em outro, tem o Infinito como limite de seu destino, livre na imagem e semelhança de Deus. Das longas observações do cientista americano, Dr.J.S.Hycox, tiramos o seguinte: Certo dia foi ele chamado à cabeceira de uma moribunda. Miss Maud Bycroft tivera um colapso cardíaco. O exame das pupilas acusava a morte física. Decide espetar no coração da morta, quatro agulhas ligadas nos terminais de seu aparelho reanimador. Com descargas elétricas fracas, mas capazes de fazer o coração reanimar-se, meio minuto após, notou-se ligeira pulsação. Oito horas depois, começaram as pálpebras a se mover. Logo após, uma voz débil fez-se ouvir. Miss Bycroft dizia: “Por que voltei?” E o médico a interroga: “Voltou de onde? Onde estava? Que sentia Miss Bycroft?” E a ressuscitada responde, com voz hesitante a principio, mas que depois se tornou resoluta: “Havia luzes e cores que combinavam com uma música de sons diversos. Sobre as ondas dessa música, me levaram. Era delicioso! Tudo era ligeiro, sem forma, flutuando no espaço. Sem sofrimento, nem inquietação. Eu estava colocada acima de tudo; tudo surgia aos meus olhos numa claridade transparente como cristal; por onde eu planava, não via senão, luz viva. Porque não me deixa lá?...” E conclui o Doutor Hycox; “Viveu três dias; a ciência dos homens não conseguiu mais prolongar sua vida e ela partiu para o país da luz”. De outra vez, viu-se à frente de Ann Belt, enferma em aparente estado de morte, em misteriosa letargia. Logrou após longa espera, fazê-la entrar em um estado de semiconsciência, e que lhe pareceu muito doloroso. Disse-lhe então o Doutor Hycox: “Fala, é preciso que fales Ann Belt. Tu te lembras...” E obedecendo as sugestões do médico, a aparente morta, respondeu: “Havia luz, cores, sons... sim, é preciso que eu continue a falar; quando eu estava morta, procurei uma mulher que ia pôr uma criança no mundo. E, para essa criança se transferiu o meu ser imaterial, o meu espírito. Tornei-me homem, fui soldado. Minha morte foi muito penosa, abatido que fui por um tiro em um porto de mar. Depois que novamente morri, tornei-me criança de novo. Como é estranho! Revivi tudo desde a morte ao nascimento. E recomecei; estive na terra sete vezes e sete vidas...” Tenho um amigo que morreu; continua amigo. Vítima de um câncer que somente lhe poupou a pele para revestimento da extrema magreza, tinha momentos de êxtase em sua fase pré-agônica. Com os olhos estáticos, fixados num vago ponto, dizia: “Que maravilha, Que beleza! Que deslumbramento!” E, quando seus olhos voltavam para os circunstantes, dizia: “Eu já morri; eu já morri! Por que me prendem? Deixem-me partir!” A beleza das coisas do Outro mundo, a paz, a tranqüilidade e a bem-aventurança, aqui raras vezes encontradas, o seduziam ao País das Sombras, onde também breve nos encontraremos. O interessante é que quase todos os fatos apontados se referem a música, cores, claridade e luz. Há poucos dias, uma menina de apenas cinco anos, abraçava ao tio que havia perdido a esposa há alguns meses, e conversavam. O assunto era a esposa e uma lágrima furtiva correu-lhe pela face. Percebida pela criança em seu colo, sem que jamais houvesse ouvido tal coisa, exclama consoladora: “Tio, não chora! A tia não morreu, não! Ela está viva. Está in-vi-si-vel!” - destacando bem as sílabas. “Nós não a vemos por isso mesmo!” “Olha tio”, apontando para uma poltrona à sua frente, “ela é capaz de estar ali sentada, ouvindo a nossa conversa; a gente não enxerga, porque ela está invisível!” E apontando para o alto, “Tio, eu vim de lá de cima. Lá existe uma porção de cidades,” - na casa de meu pai, há muitas moradas, disse Jesus – “muita gente ficou chorando por causa de eu vir para cá”. Conceito, certamente, profundo na boca de uma criança, pela qual, Deus algumas vezes fala! Esta, para nós, a consoladora verdade, a Grande Esperança.


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.




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