LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
Com sua fertilidade característica, Nelson Lorena escreveu em forma de crônicas sobre, história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. Do acervo de sua produção, entre 1977 e 1990, destacamos a matéria publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano I, edição nº.37, de 27 de janeiro a 02 de fevereiro de 1978.
O FALSO E O VERDADEIRO ALTRUISMO
NELSON LORENA
É inegavelmente uma virtude santificante, o preocuparmos com os problemas alheios, colocando, em segundo plano, aqueles que nos dizem respeito. É um patrimônio dos Santos mas, ainda existem sobre a Terra algumas criaturas que podem ostentar na fronte a auréola da santidade. Possuíamos uma Tia, uma grande Tia; amizade sincera, fiel, uma dessas afeições tão raras nos tempos em que vivemos, tal como uma luzerna a iluminar as noites caliginosas das flutuantes e incertas amizades que nos rodeiam. Era contudo, cheia de problemas, de preocupações que se acumulavam uma após outras, como se isso fosse já sua norma de vida. No entanto, merecia sua especial atenção e cuidados, as vicissitudes alheias, principalmente os meus revezes e fracassos, minhas dificuldades, enfim, esse estado de coisas, de miséria disfarçada que constitui a vida da maioria de nosso povo; a adversidade, na maioria das vezes, foi para mim um estímulo para a luta. O que ela sentia por mim, eu sentia por ela. Pensava eu em lhe oferecer uma obra de Marden, ou Ellick Morn, ou mesmo Carnegie, quando um belo dia ela me visita, trazendo nas mãos o “Como evitar preocupações”, se não me engano, de Dale Carnegie. Achei graça, porque, seus problemas eram muito mais agudos que os meus. Minhas preocupações eram transitórias e comuns, como em todo lar, mas as suas eram permanentes, embora já houvesse lido e relido a obra. Analiso minha Tia, como uma célula que é, no imenso organismo da humanidade. Esta por sua vez, é a célula dilatada. Sofre a parte como sofre o todo. O Ser é a humanidade, com todas suas facetas de dores, alegrias, erros, acertos, fraquezas e fortalezas. Às vezes no comportamento de um Ser humano, vemos refletida a índole de um povo, assim como uma célula enferma define o estado mórbido de quem a possui. Vemos assim, à nossa frente, um mundo enfermo. Seu organismo, comprometido pela ambição, pelo medo recíproco entre as Nações, pela falta de Fé num Deus que tudo vê e prevê. Os governantes se arvoram em computadores de inteligências, se envolvem em querelas de outros povos, onde interesses inconfessáveis estão velados por uma falsa atitude de pacificação. Preocupam-se com a fumaça no horizonte ao longe e não atentam para o incêndio do crime, da corrupção de costumes, das doenças, da miséria íntima que a publicidade impede divulgar. Pretendem varrer os direitos humanos postergados de fora para dentro, deixando a própria casa montoada de detritos. Em nome de interesses financeiros e comerciais, destroem-se nações, arruínam-se países, para depois lhes oferecerem ajuda econômica para a reconstrução, ocultando sob a máscara da piedade, o cinismo da atitude. O desprendimento de minha tia, o esquecimento de si própria, eram próprios dos Santos; sua felicidade era a alegria e a paz alheias. O “desprendimento” dos governantes, não se baseia nem mesmo nos rudimentares sentimentos de fraternidade, dessa fraternidade de que falam e ouvem, somente entre as quatro paredes de suas igrejas. Interesses subalternos, é a fonte orientadora de suas ações. Defendem a liberdade e os direitos humanos de outras terras e olvidam os próprios. Criam obstáculos ao desenvolvimento nuclear, econômico e financeiro das nações, temerosos de perderem, no futuro, sua liderança e condição de polícia do mundo. O escândalo de Watergate a absolvição da guerrilheira e assaltante de bancos, Patrícia Hearst, a absolvição dos jovens e ricos filhos de milionários, seqüestradores de ônibus de colegiais, a degeneração da raça pelo abuso indiscriminado dos tóxicos, o aumento da criminalidade e das enfermidades; a esse povo, preocupado com um império que se desfaz, seguindo o fatalismo histórico que absorveu Macedônia, Assíria, Roma e em nossos tempos, França e Inglaterra, é que aconselharíamos, a exemplo de minha saudosa Tia, o “Como evitar preocupações”.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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