LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano III, edição nº.138, de 18 a 24 de janeiro de 1980.
POLÍTICA
NELSON LORENA
Tema que jamais pensaríamos abordar, assunto que me repugna; sórdido, sujo, vergonhoso! Teria sido sempre assim? Parece-me que, não. Na Grécia, houve uma época em que política se podia escrever com "P" maiúsculo. O povo era livre, se reunia em praça pública, nas arcádias, nas ruas, expressava suas idéias, fazia suas críticas, mesmo aos poderes constituídos. As coisas nascem belas e bem intencionadas, mas nas mãos dos homens sofrem deturpações, assim também as artes e as religiões; a Política, como arte de governar, não escapou à regra. Transforma os aviões, as máquinas, os navios, a libertação do átomo, inventados e descobertos para conforto da humanidade, em escada para acesso ao Poder na ânsia de mando. Contaram-me que, em um lugarejo de Minas, o rondante de uma cerâmica soube por um amigo, que durante sua ausência, sua cama era ocupada por outro. Até aí nada de importante, mas acontecia que na mesma cama dormia sua mulher. O rondante dizia-se valente, como quase todo homem baixinho, tipo que a morfologia classifica em braquimórfico ou brevilíneo, resolve o caso à bala. O amigo lhe empresta o revolver; simula trabalho e, sem que seja pressentido, às ocultas mete-se embaixo da cama adúltera a espera do sedutor. Era o dono da cerâmica; homem de compleição atlética, hercúlea, a quem o pobre rondante logo reconheceu e que se confirmou pelas botinas, de número quarenta e quatro, atiradas quase na sua cara. Dia seguinte, entrega o revolver carregado ao amigo que lhe pergunta: “Matou o homem?” e a resposta; “Não espalha, não espalha; mas eu urinei nas botinas dele!” Mas, afinal o que tem essa anedota com a Política? Em quase todas, há sempre uma correlação com os tempos e costumes em que se vive. O Homem, desde que nasceu é político. O rondante o foi, sabiamente; entre um herói morto e um canalha vivo, preferiu a última alternativa, numa solução altamente política, como seja a da sobrevivência, sua e da família, tudo se acabou em paz, com arrependimentos e perdão. Platão era de opinião que os reis deveriam ser filósofos e os filósofos reis, já que voltados para as coisas divinas, possuíam visão mais ampla dos problemas humanos e maior capacidade para a sua solução, sem as peias do personalismo. Um desejo irrefreável, de posse e de poder, corrompe e afasta a abertura democrática e cria a “fechadura” em uma porta mal aberta. Não está aí o Sr. Maluf, candidatando-se à presidência da nação, pedindo votos até no estrangeiro? Não temos razões para duvidar de sua capacidade, mas temo-la para não crer em seu sentimento democrático. O povo o escolheu? Onde e como? A ameaça de uma guerra nuclear paira sobre nós, com a invasão condenável da embaixada americana no Irã e das exigências que o Aiatolá faz para sua libertação. Há mais de dois meses, Carter ameaça, fala, esbraveja, promete sanções e volta atrás, por inócuas; fala em bloqueios, resolve tomar atitudes, ora drásticas ora conciliatórias. A ameaça de uma guerra nuclear paira sobre nós, com a condenável invasão da embaixada americana no Irã e a confinação de seus funcionários, alguns dos quais, considerados espiões. Foi um erro político, pois deu mais popularidade e prestígio a Carter, o homem que eles mais odeiam. Em franca decadência política, por sintomas que vêm desde a Coréia e o Vietnam, agora, a autodeterminação das nações latino-americanas, o Irã e o Afeganistão enfrentam os EEUU, qual a um novo Golias, o desprezo e a humilhação de modernos, Davis; que sacodem a sela e procuram se libertar dos varais “paternais”. Onde a sã política, filha da Razão e da Justiça? O povo americano e, principalmente, Kenneddy, o maior adversário de Carter na futura eleição, poderão lhe perguntar, ante as bravatas e ameaças, como o amigo rondante da anedota: “Que fizeste em desafronta ao nosso orgulho, a nossa honra?” E Carter, talvez como o rondante: “Mas, eu urinei nas sandálias do Aiatolá!”.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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