UMA LUZ QUE SE APAGA

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.





O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, religião e temas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano III, edição nº.135, de 28 de dezembro de 1979 a 03 de janeiro de 1980.




UMA LUZ QUE SE APAGA

NELSON LORENA


Foi assim: Estava a noite muito amena e doce, dentro de uma calma santificante. O céu era de um azul escuro. Ali, as estrelas se assemelhavam a brocais prateados atirados ao léu sobre uma colcha de anil, onde Orion se destacava com todo seu esplendor como a mais bela constelação do universo. Dirigíamo-nos para nossa casa, subindo o asfalto da Santa Casa. Nossa postura, talvez pela idade, talvez pelo aclive da rua, com o corpo a mais ou menos setenta graus, levava-nos a olhar mais para o chão negro de betume, que mesmo para o alto. Subitamente, como se do céu mão poderosa iluminasse a rua com a luz de um farol potentíssimo, tudo ficou deslumbrantemente claro; um luar, de uma suavidade jamais vista, despontou milagrosamente. Um medo, um pavor indescritível se apoderou de nós, ante o insólito fenômeno, e sem que houvesse tempo para formularmos qualquer juízo sobre o acontecido, explode de nossa garganta: “Meu Deus! Meu Deus! O que é isso, Senhor?!” Petrificados ficamos, como alguém que espera uma irremediável desgraça, partida do céu. Foi quando para ele olhamos. Então, vimos um meteoro brilhante, rasgando-o de horizonte a horizonte, dividindo a abóbada celeste em duas partes, deixando um rastro flamejante, que lentamente ia se apagando, escurecendo, deixando um sulco turvo, uma cicatriz atestando sua passagem pela Terra, ao se perder na imensidão do Infinito! Agradecemos a Deus, nos haver permitido assistir tão maravilhoso espetáculo de ordem física, mas que exerceu moralmente em nós, grande influência. Nada somos ante a grandeza e poder de Deus! Houve uma mulher em nossa cidade, muito conhecida pelo seu metal de voz, normalmente alta, sem rebuços, sem segredos, que passou pela vida, vida breve, considerada a grandeza de seu coração, a pureza de sua alma. Iluminava a caminhada dolorosa dos aflitos, derramando consolação, curando os enfermos com os dons que em vidas sucessivas amealhou e que, como um meteoro, causou espanto e pasmo aos próprios descrentes, ante a extrema dedicação e amor que prodigalizava aos aflitos, numa época em que somente a maldade e a indiferença governam a humanidade. E que, também, como um meteoro desapareceu, penetrando na imensidão infinita do País da Luz, que nossos olhos verão um dia. Deixando, ela também, um sulco, uma marca gostosa de se ver, embora com dorida saudade. Essa mulher era Geralda Cantanhede, denodada batalhadora do Bem, desencarnada repentinamente, e que na véspera já o pressentira. Seu passamento deixou um vácuo, abriu uma clareira nas fileiras dos inumeráveis apóstolos do Cristo. Seu enterro grandemente concorrido, o pranto irreprimível de seus amigos e irmãos, foi a apoteose que Deus concede e com que premia aos que seguem as veredas do Mestre. Apagou-se assim uma luz na Terra, para ressurgir mais brilhante que nunca na eternidade dos Eleitos do Senhor!


*****


Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.




Veja também:


NELSON LORENA – O ARTISTA CACHOEIRENSE


A ARTE DE NELSON LORENA






*****

Nenhum comentário :