CONSELHOS A UM AMIGO

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano III, edição nº.147, de 24 a 30 de março de 1980.




CONSELHOS A UM AMIGO

NELSON LORENA


“Não precisa me dar conselhos, sei errar sozinho”. Este dístico encontrei, certa vez, na entrada da casa de um amigo. Analisando aquela filosofia/advertência concluí que, meu amigo admitia sempre o erro, quando se dá um conselho. “Sei errar sozinho” significa que para errar, basta uma só cabeça. Mesmo assim, arrisco-me a dar um conselho a um amigo o qual, muito prezo. Longe vão os anos em que lhe ministrei aulas. Mais de trinta anos nos separam, neste particular. Agora você, favorecido por Minerva na cultura, por Apolo na arte de curar, favorito de Vênus, no amor e na paz que desfruta no recesso do lar, retorna por imposição minha, ao banco de minha modesta cátedra, cheio de diplomas, títulos e Saber, com honras para a terrinha em que nasceu, enquanto eu continuo vazio, rato faminto de biblioteca, guardando com ciúmes e cuidados meu humilde diploma de grupo escolar. Por instantes, esqueço a filosofia de ante-sala do amigo e venho em nome de um sentimento paternal, cristão, lhe dar uma aula, ou melhor, uns conselhos sobre a preservação da saúde, conselhos de quem soube poupar em moço, para achar na velhice. Sua ciência considera a cafeína, o álcool e a nicotina os principais tóxicos. Na proporção de seu consumo, reside o maior ou menor efeito letal de sua natureza química. O “hábito” de fumar, não altera o comportamento do fumante, que pode abandoná-lo sem problemas físicos ou psíquicos. Já o uso imoderado, torna-se “vício” e ordinariamente dependência. E normalmente, quando ocasionalmente lhe falta o cigarro, cria-se um estado psíquico de irritação, mal estar, insatisfação, sintomáticos de dependência física e psíquica. “Usado”, afirmam exercer um poder tranqüilizante; “Abusado”, pode ocasionar vômitos e irregularidades do ritmo cardíaco. Pessoalmente, venho observando, câncer dos pulmões, enfisemas, asma brônquica, perturbações cardíacas em parentes, amigos doentes e outros. Afirma a ciência que, a cada cigarro que se fuma, perde-se cinco minutos e meio de vida, ou seja, vinte anos em quarenta cigarros absorvidos. Não é somente a nicotina que degrada o homem, há no fumo, hidrocarbonatos, o benzonireno, um dos mais poderosos cancerígenos conhecidos, o monóxido de carbono que dificulta o transporte de oxigênio pelo sangue e abrevia uma vida como a sua, desejada pela utilidade que nos empresta. Com os olhos fechados para tão magno problema, as autoridades permitem a propaganda sofisticada pelos órgãos de publicidade, de um vício que faz mais vítimas que qualquer guerra por nós conhecida e que, desde 1971 foi proibida nos EEUU. Talvez daí, a razão dos trustes americanos, dos traficantes da saúde explorarem-nos, onde o campo está livre, sem leis proibitivas, para os imensos lucros que mandam para a British American Tobacco. Dizem observadores, que o hábito de fumar aumenta a capacidade de trabalho, quando a monotonia torna-se uma característica da profissão. Sua profissão é ativa e intensa e não necessita desse “estímulo”. Você, que faz da profissão um sacerdócio, virtude hoje que se torna rara na medicina mercantilizada atual, prolongue a sua existência. Há olhos súplices repassados de angústias e dores, reclamando amor, carinho e vida. Como a interrupção abrupta da dependência é contra indicada, você, que não precisa de conselhos, pois sabe acertar sozinho, aceite este somente: a cada dia diminua um cigarro no seu consumo. A dependência será eliminada aos poucos, o abuso se arrefece, o hábito se controla, o tabagismo é vencido, a vida se prolonga. Estará dizendo, estou ouvindo coisas que já sei há muito tempo; que chove no molhado; que o fumo realmente mata, mas que você não tem medo de morrer; que sabe errar sozinho e, mais coisas... Mas, um dia quando os conselhos produzirem seus frutos, talvez dirá à imagem etérea do amigo que findou: Obrigado, mestre amigo!


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.




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