LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano IV, edição nº.188, de 01 a 11 de janeiro de 1981.
HOJE, COMO ONTEM!
NELSON LORENA
Desde os primórdios da sociedade humana, o progresso tem seu fundamento na exploração do homem pelo homem. A luta pela sobrevivência caracterizou-se pela supremacia do mais apto, do mais forte sobre o mais fraco que, para viver, obedeceu. E foi assim que o carro do progresso começou a se movimentar, ao suor do braço escravo. Uma escravatura mascarada e hipócrita e outra, sem máscara e sofrida, consolidavam a situação dos poderosos. Ontem, como ainda hoje, há homens que se submetem a essa forma de vida em troca de uma situação cômoda e lucrativa, onde a ausência de escrúpulos rebaixa a dignidade. Há, por outro lado, outros que a ela se entregam e se adaptam, pela força do direito de sobreviver, a si e à sua família. No antigo Egito, na fabricação dos tijolos para as obras dos Faraós, os escravos pisoteavam o barro, sem cessar, mesmo que a seus pés caísse um companheiro afogado na lama, desfalecido e exausto pelo excesso de trabalho. A projeção do Faraó na História, isso impunha, isso exigia! Na Roma antiga, a escravatura mascarada e hipócrita obrigava os senadores a se sentarem ao lado do cavalo Incitatus, feito senador por Calígula, quando aquele comia seu feno dourado. Humilhante e desprezível subserviência moral! Para que Incitatus, cônsul e senador, pudesse dormir sossegado, os escravos, com as mãos calosas do trabalho rude, abafavam os ruídos das pererecas e sapos nos brejos e lagoas vizinhas. Quanto sangue, quanta vida sacrificada, quando a pretexto de progresso, a impiedade dos poderosos reduziu o próximo à condição de animal de carga, a material de consumo! No Brasil, os escravos eram comprados e vendidos aos lotes em promiscuidade com animais domésticos: bois, cabras e porcos, valendo mais que um escravo aleijado. Para que as Sinhás conservassem a elegância das formas, entregavam seus filhos ao seio da moça escrava, ainda mesmo que o filho desta chorasse de fome! Os tempos continuam os mesmos, mudaram-se os cenários, os figurantes, as platéias, mas os temas com pequenas variações continuam os mesmos. Na sociedade moderna como na antiga, a servidão de uns alimenta e mantém os interesses particulares de outros. Assim foi ontem, será hoje e assim será amanhã, pois, a concepção de progresso jamais se fundou numa justiça equânime, mas, como diz o sofista, numa justiça que nada mais é do que aquilo que dá direito ao mais forte. E aí temos, não somente trustes, empresas e até governos cristalizados pela força dessa Justiça injusta. A pretexto de fugir ao caos econômico, governos há que exportam produtos básicos da alimentação, por preços inferiores aos obtidos pelo povo nos mercados. O sacrifício de um povo mal nutrido e miserável, resolverá o desequilíbrio caótico de suas finanças? Em suma: haverá muita diferença entre a sorte dos escravos do Faraó e a dos escravos de hoje, ante o fantasma da fome, pelo alimento que lhe é sonegado?
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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