A MAIS BELA DAS ARTES

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e cenas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano IV, edição nº.156, de 22 a 28 de maio de 1980.




A MAIS BELA DAS ARTES

NELSON LORENA



Música, divina arte, cuja origem se perde nas eras dos tempos. Como teria surgido? Teria uma alma como todas as coisas e que, como as outras, faz a sua evolução através dos tempos e dos costumes? Certamente que nasceu das mãos do Grande Arquiteto do Universo. Suas primeiras manifestações teriam surgido no sibilar dos ventos de encontro às escarpas, no fragor das ondas em choques contra os rochedos, nos pios agudos das gaivotas, no uivo melancólico dos chacais, nos lamentos dos cães nas noites de luar, no canto sonoro das cotovias, nas melodias do rouxinol, dos sabiás, no trinado variado dos pintassilgos! Esta a música, antes mesmo do aparecimento do homem sobre a Terra. Mas, o senso de imitação é uma característica humana e imitou o homem, para depois então aperfeiçoar, eliminando os sons grotescos da manifestação primitiva, como uma determinante da evolução do pensamento na escala da perfeição. O homem criou a música, que rompeu em sua garganta e que, embora não sendo uma verdadeira imagem do criador, dela se aproxima. Seus efeitos, tanto na formação psicológica quanto fisiológica do ser humano, são insofismáveis, em nossa alma, em nosso corpo. Há curas maravilhosas conseguidas pela musicoterapia. Até mesmo para a expulsão menos dolorosa do feto, ela está sendo aplicada. Um dia encontramos com o Dr.Milton Pina em frente à Santa Casa; vinha ele, até, trauteando uma composição nossa e, quando juntos, ouvimos calados a Ave Maria de Gounod, tocada de um disco na Santa Casa. Ele então, me disse, exaltando a beleza do canto: ”Tenho a impressão de que, a mão de um sicário se paralisará, antes do crime, ao ouvir esta música”. Jamais nos esquecemos dessa frase, embora passado mais de meio século. Ela torna, ainda que por instantes, o bruto num santo. As estatísticas afirmam que a percentagem de músicos criminosos é, em todas as delinqüências, a menor. Não há porque negar sua influência em nossas almas, se até os animais a sentem! Possuíamos um cãozinho que chorava, chorava mesmo, ao ouvir uma composição nossa cantada por uma filha. Estivesse onde estivesse, de nós se aproximava ao iniciarmos o canto. Fouquet, ministro de Luis XIV era músico e tocava flauta, que levou ao cárcere, quando preso. No silêncio do cárcere encontrava o alento às suas amarguras, tocando árias em sua flauta. Uma aranha descia da parede e se acomodava em suas pernas enquanto ele tocava. Mais tarde, a aranha e a flauta foram esmagadas pelo Carcereiro; coisas do regime presidiário em todos os tempos! Platão escreveu na porta de sua Academia: “Não entre aqui quem não for versado em matemática”, ao que acrescentou Pitágoras, “e música”. O sentimento como efeito que a música sacra ou erudita desperta em nosso íntimo, psicologicamente não é o mesmo que o ritmo das músicas carnavalescas nos provoca e os comportamentos se modificam. Na sabedoria popular de que ”quem canta seus males espanta” há muita verdade e filosofia. Na última semana do Cristo, os discípulos, compreendendo que “a hora se aproximava”, subiram ao Monte das Oliveiras cantando um hino de louvor ao Mestre, segundo Mateus. Música divina, a mais bela das artes!


*****


Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


Veja também:


NELSON LORENA – O ARTISTA CACHOEIRENSE


A ARTE DE NELSON LORENA



*****

Nenhum comentário :