LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas, escritas entre 1977 e 1990, sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, entre outros. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano V, edição nº.214, de 13 a 19 de julho de 1981.
A PROSTITUTA
NELSON LORENA
Desde os mais remotos tempos, a deturpação das leis naturais, dos costumes, dos direitos humanos, vem transformando a razão divina das coisas, prostituindo mesmo, aquilo que de mais sagrado teríamos na existência e que seria a Paz entre os homens. Segundo a Bíblia, a humanidade já nasceu prostituída. De Caim até nossos dias, raros são os “imortais” que passaram incólumes pela vida, sem que sua imortalidade não houvesse sido tisnada pela sujeira da pederastia, da homossexualidade, da vilania, da corrupção, do suborno, da prostituição moral. Houve uma época em que a religião, com as ameaças dos “castigos divinos” freava de alguma forma a conquista material ilícita da vida, o fausto, a riqueza fácil aos inescrupulosos e cínicos. Qualquer estudante sabe da existência de um César, de um Pompeu, de um Gengis Kan, de um Bonaparte; mas nada sabe de um Carrel, de um Noguchi, de Pasteur, raros luzeiros no turvo abismo de um mundo que se desfaz. Um menino que até os dezoito anos jamais tirou a vida de um pássaro de uma borboleta, já aprendeu a tirar a cabeça de um irmão, a quatrocentos metros. A sede de conquistas desconhece escrúpulos e amor. O Deus dos Exércitos é revivido. Armam-se Cavaleiros em cerimônia “cristã” com espada de dois gumes, onde o Cavaleiro com um gume ferirá o rico que oprime o pobre e com o outro o forte que oprime o fraco, mas na realidade o que estamos presenciando é coisa diferente. Vimos pela TV, mães e futuras mães, “religiosas” por certo, adestradas no manejo de armas para matar e elogiadas por já saberem matar de futuro os filhos de outras Mães! Belo espetáculo para o Crucificado, dia-a-dia mais crucificado! Esta deterioração, esta poluição de caráter, esta prostituição e mais coisas que o valham, estão disseminadas na Arte, na Literatura, no Ensino, nas Administrações, nos Governos, na política enfim. “Os inimigos de meus inimigos, são meus amigos?” E é com o conceito cínico deste aforismo que os conseguimos, oferecendo-lhes polpudas sinecuras e condecorações, homenagens, umas palmadinhas nas costas, etc.. A religião tornou-se “o ópio do povo” , dela nos lembramos por alguns minutos, enquanto a dor nos maltrata e vinte e quatro horas depois, quando o estômago fala mais alto em suas exigências. Contam que na Irlanda, noventa e nove por cento de sua população é católica. A Irlanda do Norte, ao contrário, é protestante. Um lavrador vivia com dificuldades da cultura de beterrabas e um rebanho pequeno de ovelhas. Sua filha resolve abandonar o lar, em busca de recursos que o mesmo não lhe dava. Jovem e bela, foi-lhe fácil conseguir um emprego rendoso. O patrão prostituiu-a e, mais tarde, abandonou-a. De queda em queda, fez da vida fácil meio de sobrevivência e, assim conseguiu uma vida confortável e um certo luxo. Enquanto isso, os negócios do pai iam de mal a pior. Anos após, quase foi atropelado ao atravessar a O’Connel Street, a rua mais movimentada de Dublin. O motorista parou o luxuoso carro, dentro do qual a passageira era justamente a filha do velho lavrador. A euforia e as alegrias dominaram os dois no feliz reencontro. Levou o pai à sua residência, disse-lhe que a casa era sua, o carro também e o motorista era seu empregado. A ostentação e o requintado luxo dos móveis confundiam o velho que logo anteviu nas posses da filha sua reabilitação financeira. “Mas então, minha filha, você casou-se?” E ela respondeu-lhe “Não pai, eu sou prostituta”. O velho quase desmaia. “Mas, filha de Deus, e a nossa Fé, a nossa religião, você não pode abjurá-la dessa maneira. Volto para a miséria, mas não deixo minha Fé por coisa alguma.” Os minutos de silêncio que se seguiram foram o bastante para o velho se convencer de que a filha ainda era a sua “tábua de salvação”. Volta-se para ela e lhe pergunta; “O que mesmo que você disse que era?” “Meu querido pai, você não voltará mais para o sítio; irá morar comigo. Eu lhe disse que era pros-ti-tu-ta!” E o Pai, mostrando-se aliviado: “Que peso tirou do meu coração! Eu entendi que você dissera que era protestante”. Ainda, os encantos da Terra seduzem mais a humanidade que as promessas do Céu.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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