LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.314, de 09 a 14 de agosto de 1983.
UMA ESPÉCIE EM EXTINÇÃO
NELSON LORENA
Vimos, através da televisão, a campanha que nosso governo vem fazendo no combate à matança indiscriminada de jacarés, aves e outros animais de nossa fauna já, por isso mesmo, em fase de extinção nos pantanais de Mato Grosso. Urge, no entanto, que se faça distinção entre miséria, fome, direito de sobrevivência, prazer da caça e ganância por lucros ilimitados. Há realmente em extinção, por força da lei natural de destruição, uma série de seres vivos, tais como ursos, gorilas, vicunhas, macacos, gaivotas, condores e, para não irmos mais longe, os nossos canários-da-terra, azulões, pintassilgos e até mesmo nossos urubus, estes últimos que nosso Brasil chegou a exportar para a Holanda às centenas, úteis auxiliares da saúde pública. Já dissemos certa vez que, na conciliação dos opostos reside a harmonia, o equilíbrio de tudo. Destruição e conservação são forças equivalentes. Quando a destruição excede aos limites das necessidades humanas, devemos combatê-la. Devemos permiti-la, no entanto, quando o dever de conservação própria o exige. Desde que o homem primitivo surgiu na Terra, segundo afirmam, há mais ou menos três milhões de anos, tornou-se destruidor. Guiado pelo instinto, mais que pela inteligência, destruía tudo quanto lhe parecia útil à sua sobrevivência. Com o aparecimento do Homo Sapiens, há duzentos mil anos, dotado de grande capacidade de pensar, iniciou-se a era do homem moderno. O instinto destruidor foi controlado pela inteligência, muito embora capaz de modificar a beleza, a pureza e a simplicidade da vida, até então, do mundo em que vivemos. Paradoxalmente, há um zelo pela conservação dos seres inferiores da criação, enquanto a preservação da espécie humana está na mira dos mísseis, dos canhões e das armas. Os processos sofisticados pretendem mascarar a “fera dilatada” que é o homem. Imaginem caros leitores, nosso governo cuidando do planejamento da família, no sentido de controlar a explosão do nascimento das crianças como meio de diminuir seu encargo de manutenção, com reflexo animador para suas insolventes finanças. Como os nossos urubus, que morrem e se extinguem por falta de carniça, já que a industrialização da carne aproveita tudo da rês e os filhotes morrem de fome, nossas crianças à falta do leite, do pão, do feijão, do arroz, na miséria do salário que mal dá para o aluguel da casa, não terão infância. Esse será o espetáculo que veremos numa família de cinqüenta milhões de brasileiros, mais uma espécie em extinção. Todavia, não mais assistiremos também, a luta dessas criaturinhas disputando nos depósitos de lixo dos nossos mercados, coisas para comer.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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