LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.324, de 17 a 23 de outubro de 1983.
MÁGOAS RECALCADAS
NELSON LORENA
Durante muito tempo, há vários anos, com o auxílio de um telescópio, embora de reduzido alcance, devassei o Universo dentro do limitado espaço que meus olhos podiam alcançar. No reduzido âmbito do seu alcance, encontrei maravilhas surpreendentes na história de um Deus que limita nossas investigações, para que nos convençamos da nossa pequenez, da nossa infinita ignorância ante Sua inteligência e poder, divinos. A ciência comparada, que é para nós a lógica da Verdade que a razão nos impõe, leva-nos à convicção da existência da vida em outros mundos, além do em que vivemos. Maravilhava-me ao contemplar as constelações, particularmente a de Orion, a das Três Marias, onde Rigel e Betelgeuse, a mais de cem e trezentos anos luz respectivamente distantes da Terra, são qualquer coisa de fascinante e confundível!... Confunde-nos, mas nos fortalece a crença na vida de seres irmãos, pensantes e mais felizes que nós. São as Moradas na Casa de meu Pai, de que Jesus nos fala. A felicidade e a paz de uma casa não estão no seu aspecto miserável ou opulento mas, ao contrário, na educação dos seus moradores e na moral aplicada, e, nestes princípios, a essência da Vida, as leis do Saber viver. Contudo, intrigava-me na adolescência despreocupada, como conciliar a idéia de um Deus em tudo, em meio à diversidade de destinos tão vários e contraditórios. Mas o homem é o artífice de seu destino que, bom será se o Amor presidir a todos os seus atos, quer sejam morais ou materiais, do que Jesus é o exemplo. Eventualmente, algumas obras materiais não escapam ao abandono de uns, à sanha do vandalismo de outros, das calamidades das guerras, mas, o amor com que foram construídas jamais perde sua essência que, identificada com a alma, permanece indestrutível impulsionando o autor para a frente e para o Alto. Por outro lado, há obras em que o altruísmo vem acompanhado da vaidade, um dos males da nossa civilização. Mas, que apesar de tudo, como diz Alibert, não deixa de ser um dos mais fortes moveis do progresso, das artes e da prosperidade humana. Mas o mal, segundo Matterlink, é o bem mal compreendido. Às vezes, de um ato sensual, erótico e pecaminoso, nasce um gênio. Da decomposição de nossos corpos nascem as flores que perfumam as necrópoles. Ai do progresso de nossas cidades, se não fosse estimulado pela vaidade. Napoleão explorava no soldado, o herói, fazendo dele um general Murat. Há quarenta e sete anos minha concepção da vida era outra. Ainda não havia lido o Eclesiastes. Posta em dúvida a minha capacidade de construir o monumento da praça, enchi-me de orgulho, talvez mesmo de vaidade, e o fiz. Mas, nem sempre a vaidade favorece nossa cidade. O puxa-saquismo é mais pródigo. A destruição da obra, modesta e provinciana, puramente construída com “prata da casa”, no dizer do inesquecível Vidinho, vem sendo destruída lenta e progressivamente. Que haja Amor em sua recuperação, por parte de quem for incumbido, e mais interesse em sua conservação. Eternas são as obras feitas com Amor, de que a vida de todas as coisas depende. Um dia, isto conseguido integralmente, faremos jus a uma Nova Morada na Casa de Meu Pai, como uma daquelas que, com os olhos no ocular do telescópio, divisei no Infinito como a criança cobiçosa vê, através dos vidros da vitrina, os brinquedos que ainda não pode possuir.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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