POR FALTA DE ASSUNTO

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.330, de 29 de novembro a 04 de dezembro de 1983.




POR FALTA DE ASSUNTO

NELSON LORENA




Dando uma arrumação na ordem, numérica e cronológica, dos exemplares de “O Cachoeirense” no meu arquivo, encontrei uma frase do Prof. Agostinho: “É tempo de parar”. Naquela ocasião, fiz ver-lhe os inconvenientes e as lacunas que isso iria abrir nas folhas de nossa imprensa. Resolveu, então, continuar, até sua última crônica de número LXXXV. Sinto que se aproxima o momento de, como o velho amigo, pronunciar a mesma frase, pois, se o barqueiro está pronto para o trabalho, o barco está dando água. Os assuntos se esgotam ao peso do cansaço físico e mental, que as tarefas e obrigações atinentes à sobrevivência exigem. Sem assunto, para dar “uma mãozinha” ao Prof. José Mauricio no seu jornal, resolvi passar pelos olhos uma obra do professor, jornalista e escritor alemão, Karl Von Koseritz, intitulada “Imagens do Brasil”. Encontrei o interessante trecho em que narra sua passagem por Cachoeira, em 6 de novembro de 1883, justamente há um século. Hospedou-se no Hotel Lobão, um dos cinco que havia na Vila e que, apesar da reforma que sofreu, ainda mantém as mesmas linhas de origem. Um dos raros, ou talvez o único marco de uma época, em que Cachoeira se projetava como futurosa cidade. Observei alguns enganos na narrativa, que confunde Queluz paulista com a Queluz mineira, a Estrada de Ferro Rio Verde, mais tarde Rede Sul Mineira, com a D.Pedro II. Nossos escritores também, às vezes, colocam a Sesmaria de Silva Caldas na Margem Esquerda e Mato Dentro, da Serra da Bocaina, no pé da Mantiqueira! O escritor alemão observou que os empregados da D.Pedro II, que saia do Rio, eram amáveis e prestimosos no trato com aos passageiros, mas os da São Paulo-Rio eram grosseiros, indiferentes e brutos. A baldeação aqui se fazia, da bitola Larga para a estreita, o que durou até 1895 quando se iniciou o alargamento. Pessoalmente, também acho o carioca mais expansivo, mais comunicativo e amável que o paulista. Questão de índole e de temperamento. O que importa é o que vem de dentro para fora e, não, o que vem de fora para dentro. Seco, duro, ensimesmado, fechado, era, de alguma forma, a característica daqueles que fizeram com que a população de dois mil e quinhentos habitantes mantivesse casas comerciais, lojas, padarias, hotéis, comissários de café, lavradores de cana-de-açúcar, três bandas de música, jornais, dez vezes mais que a nossa terra com vinte e cinco mil habitantes, atualmente! E assim, de avanços e recuos, o progresso caminha lento mas, progressivamente, em nossa Cachoeira. É, contudo, inegável o crescimento do número de bares, do consumo de bebidas alcoólicas, dos tóxicos, dos crimes, dos roubos, dos atentados e depredações ao patrimônio público, em rápida ascensão. Tristes imagens, que se confundem dentro daquilo ao que se chama Progresso.


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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