LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.
O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.336, de 16 a 22 de janeiro de 1984.
QUEM NÃO ARRISCA NÃO PETISCA
NELSON LORENA
Como todos sabem, minha Senhora faz os melhores doces do mundo. Que os leitores não se atenham à propaganda mas, tão somente, ao fato que vamos mencionar. Houve uma ocasião em que, finda a Primavera e consequentemente havendo escassez de flores, fomos invadidos por verdadeiro enxame de abelhas, atraídas pelo cheiro adocicado do ar de nossa casa. Houve até acidentes provocados, não por elas, mas, ao contrário, pelos próprios domésticos imprudentes dos quais elas se defendiam. Como já havíamos erradicado nossas colméias, resolvemos descobrir a procedência do enxame. No campo vizinho, ao redor de uma secular figueira estava um grupo de garotos empunhando tochas acesas de sapé, queimando as abelhas alojadas nas profundidades de uma talisca de árvore. Tentamos dissuadi-los do ato bárbaro. Foi em vão. Justificaram-no dizendo que para se conseguir o mel, somente eliminando-as a fogo. Fizemos-lhes compreender o perigo mortal de uma picada num vaso sangüíneo. “Mas o risco compensa e quem não se arrisca não petisca”, disseram-me os garotos. Temos assistido, pela TV, flagrantes de assaltos a pessoas, a bancos, em que o assaltante arrisca a vida e, comumente a perde, na tentativa de uma pausa no desespero e miséria que lhe impuseram os poderes incompetentes. Tristes espetáculos que, como o assassinato de um jornalista alemão recém chegado ao Brasil, retratam a péssima imagem de nossa Pátria no estrangeiro. Consideramos a política importante arte, quando objetiva o Poder para a felicidade do Povo, sua manutenção, sobrevivência e cultura. Platão era de opinião que, ao filósofo competiria o Poder, pela sua compreensão mais acurada dos problemas humanos. Sabedoria seria libertar o homem, escravizado e imobilizado no tronco do desemprego e da fome; tiraria o mel, sem sacrificar as abelhas, poupando-as para futuras produções. Numa azáfama notável, para que seja evitado o tombamento dos oito milhões de quilômetros quadrados de nosso Brasil, sob a tutela da CONDEPHAT dos ricos donos do mundo, movimentam-se os políticos, acreditamos, com os mais nobres sentimentos, para a sucessão presidencial, na esperança, embora remota, de libertar o gigante “deitado eternamente em berço esplêndido”, esmagado ao peso de cem trilhões de cruzeiros, que deve e não pode pagar. Triste espólio de 64 que, meia dúzia de abnegados, talvez bem intencionados ao disputar o Poder, pretende fazer desaparecer na luta contra a falência, contra a desmoralizante insolvência. É um grande risco a que se propõem os presidenciáveis. Patriotismo? Interesses subalternos?! “Chi lo sá?!” Procurando fugir desta política com “p” minúsculo, recuo meu pensamento agora, nem sei por que, à figueira do mel, à disputa pela sua conquista parecendo ainda ouvir a justificativa jovial, álacre, dos garotos: “O risco compensa: quem não arrisca não petisca”.
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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.
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