A FORÇA DOS DESTINOS

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.446, de 28 de abril a 04 de maio de 1986.



A FORÇA DOS DESTINOS

NELSON LORENA


Existem fatos em nossa existência que fogem das explicações normais, das conclusões humanas. As conjecturas sobre o que iremos narrar ficam por conta do leitor interessado, como quiser. Poderíamos incluí-lo na Coluna de Botyra Camorim, “Coisas que Acontecem”, mas não devemos abusar de sua condescendência.

Estávamos no ano de 1929 quando fomos removidos para o Rio de Janeiro, como funcionário da Central do Brasil, que éramos. Conhecemos na repartição em que fomos lotados, um rapaz que se tornou um grande amigo, simpático, insinuante e espírita. Chamava-se, Isaltino. A vida nas grandes cidades é bem mais difícil do que estamos habituados, no interior. Para enfrentá-la, começamos a reproduzir retratos de colegas, a preços módicos. Isaltino tinha uma namorada em Paraíba do Sul e pediu-nos para reproduzir seu retrato. Tratava-se de uma jovem muito bela, rosto de Madona, longos cabelos cacheados caindo ao colo. Reproduzimo-lo. Desfeito o namoro, não quis ele mais a fotografia, que ficou conosco como acervo de nossa arte. Aprendemos a gostar da moça através da imagem, como se fosse a uma santa. Em 1930, voltamos para Cachoeira Paulista, para a Banda de músicos de nosso Pai, para nossos amigos, nosso teatro e nossos irmãos. A Revolução de 32 pôs-nos em fuga, deixando a cidade à sanha dos soldados da ditadura. Em Aparecida, ficamos e trabalhávamos como secretário do Dr. Egberto Prado Lopes, diretor revolucionário do Ramal. De volta a Cachoeira, encontramos o retrato de Verinha, esse era o seu nome, com uma inscrição ao lado: “Encontrado no lixo e recolhido por uma alma caridosa. Soldado do 4º RAM do Rio Grande do Sul.”

Os anos correm velozes, como corsas assustadas! Em conversa com um amigo, filho e morador de Paraíba do Sul, mais de quarenta anos depois, relatamos a ele o fato e, ao citarmos o nome de Verinha, afirmou-nos conhecê-la como esposa de um português, proprietário de uma cerâmica. Investigando, encontramos o endereço e remetemos o retrato. Verinha agradecida, presenteou-nos com um seu romance “Anjo Sacrificado”, obra mediúnica.

Mantendo correspondência, tornamo-nos amigos, confrades, de uma maneira tão curiosa, explicável na afinidade das almas e iniciada há mais de cinqüenta e seis anos, sem o conhecimento pessoal, de um ao outro.

No entrelaçamento das almas afins é que Deus constrói o mundo de Paz Eterna com que o Cristo nos acena. Cumpre-nos conscientizarmo-nos de que somos de ontem, de hoje e seremos de amanhã.


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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