O EXEMPLO DO BURRO

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.




O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no Jornal “O Cachoeirense” Ano VII, edição nº.464, de 01 a 07 de setembro de 1986.



O EXEMPLO DO BURRO

NELSON LORENA


Faço do trabalho a maior razão da minha existência. Descambo no “tobogã” da vida em declínio, sem que me aperceba do ocaso, já à vista. Dou as costas para este e mergulho na atividade por dez a doze horas diárias, o que me afasta até da vida social. Excepcionalmente, ontem, saí à cidade por motivo de força maior. Ao passar pela Rua Prefeito Antonio Mendes, antiga XV de Novembro, fui despertado pelo roncar de uma motocicleta, dirigida por um irresponsável a mais ou menos 120 a 130 quilômetros por hora, em demanda da Rodoviária, sem o menor respeito à vida dos seus semelhantes. E, infelizmente, não havia na hora alguém responsável pelo policiamento para a necessária e merecida punição. Na Rua Maestro Lorena, a competição entre veículos motorizados (motos e automóveis) é uma constante. A construção de obstáculos, já reclamada aos responsáveis, é uma medida que se impõe. Um desses abusos já pôs em perigo, inclusive, a vida de uma das minhas filhas. É inconcebível como animais racionais, como são os homens, possam arriscar a própria vida e a do próximo, na sensação criminosa da velocidade. Existe ali uma linha mal construída de “tartarugas”, que muitos dos racionais não observam, com diminuição da marcha. A propósito, lembrei-me que bati palmas para o cavalo ou burro, do Custódio. Mostrava a minha “vaca enjeitada” (todos já conhecem a estória) a alguns curiosos quando passava na rua o nosso amigo Custodio, de pé no estrado da carroça puxada pelo seu burro, fazendo um cigarrinho de palha para fumar, sem se aperceber da aproximação das “tartarugas”, mas que o burro já havia notado. Caminhava o animal assim no segundo tempo do trote e, ao deparar com o obstáculo, reduz para o primeiro tempo (devagar). Quando o barulho das rodas anunciou a transposição do obstáculo, o animal repondo o trote no segundo tempo, acelerou. Fez, justamente como o fazem alguns motoristas mais cautelosos. Por instantes, mais uma vez deparei com a verdade de que, às vezes, se confundem os homens e os animais. Observando, meditando e comparando o comportamento do homem e dos irracionais, afetivos uns, violentos outros, concluí como o filósofo que diz: “o Homem é a fera dilatada. Esta, mata pela sobrevivência da espécie, o Homem, por sua destruição”.


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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