RABI, ONDE ESTAIS?

  LITERATURA DE NELSON LORENA
Patrono Eternal da Cadeira Nº.13 da Academia Valeparaibana de Letras.



O acervo literário de Nelson Lorena compreende cerca de quatrocentas crônicas sobre história, ciências, crítica, política, filosofia, religião e temas do cotidiano, escritas entre 1977 e 1990. A matéria de hoje foi publicada no jornal cachoeirense "A Noticia" e republicada postumamente pelo "O Cachoeirense” Ano XV, edição nº.695, de 16 a 31 de janeiro de 1992.



RABI, ONDE ESTAIS?

NELSON LORENA


O mais perfeito dos homens, aquele cujos princípios são relâmpagos nas noites tempestuosas de nossa existência, continua preso à cruz do martírio, inerte, abatido como um anjo ferido. Essa imagem encima altares, lares e alcovas, muitas vezes, adulterinas. Seu santo legado, seu verbo ardente e sedutor e sua moral, divina como a luz brilhante de um sol, não conseguem transpor em toda sua força os corpos translúcidos e ainda não tiveram a força capaz de abrandar a dureza dos corações humanos.

Os povos que se dizem cristãos, deflagram a guerra, o morticínio em massa, espalham a desgraça, a viuvez, a orfandade e, num gesto de falsa caridade, talvez de arrependimento, autorizam a adoção dos orfãozinhos, inocentes vítimas de seus desmandos. Lamentam, quando um espinho fere e sangra as carnes de um filho e sorriem, quando uma bomba de napalm arranca com sua gelatina escaldante a carne, em postas, do inimigo.

Mestre, onde o vosso “Amai-vos uns aos outros”? Solicitam verbas fabulosas e sangue jovem, para conservar acesa a fornalha da destruição e, como quem morde e assopra, aumentam os berçários para a nova onda de órfãos que estão fabricando. Preferem as exortações do Salmo 69: “Derrama sobre ele (o inimigo) a tua indignação e prenda-o ao ardor da tua ira; fiquem isolados os seus palácios e não haja quem habite nas suas tendas... consome-o, de modo que não existam mais e dêem gemidos como cães rodeando a cidade”. Preferem o deus dos exércitos, que manda esfolar, assar, arrebentar de encontro aos rochedos as cabeças das crianças, passar pelas armas os vencidos e entregar as donzelas aos vencedores, já que da indústria da guerra depende grandemente a opulência de seu povo. Paradoxalmente, esforçam-se por uma paz no Oriente Médio e estimulam a guerra no sudeste asiático. Incoerência de atitudes, que revela a indiferença pelos ensinamentos do Meigo Nazareno.

Mestre onde estais? Aqueles que tiveram a ventura de conviver convosco, continuaram a amá-lo. Qual o mortal, que conseguiu ser amado após a sua morte? Urge, para a felicidade deste mundo que se desagrega, retirarmo-lo da cruz, trazê-lo vivo para os nossos corações e não mais perguntarmos onde estais, pois o saberemos estrugindo de bênçãos e fraternos carinhos as nossas almas, para que a Terra se torne um recanto de Paz e, jamais, a negra mancha que rola pelo Infinito. (do Jornal “A Noticia”, Cachoeira Paulista)


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Ao professor e jornalista, José Maurício do Prado, ex-diretor proprietário do jornal “O Cachoeirense”, os nossos agradecimentos pelo acesso aos originais.


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